BANANAS, ARTE E MUITO ALVOROÇO NO MUSEU DE SEUL

Superadas as memórias de Rembrandt, Rafael e Michelangelo, e mesmo que ainda à sombra da Capela Sistina, hoje nós nos recrudescemos a contemplar bananas. Com efeito, a manchete que outrora remeteria a qualquer show de comédia, há muito foi prevista por intelectuais do ramo como o futuro que nós chamamos de ‘realidade artística’, modernismo ou loucura.

A Comediam, obra produzida por Maurizio Catelan, consiste em uma Musa spp. fixada com fita adesiva em uma parede. A ideia do artista foi produzir uma “”arte””” “satírica” e que desafiasse  a interpretação do público que, exposto à fruta, vislumbraria um “símbolo do comércio global, um duplo sentido, bem como um dispositivo clássico de humor”, conforme entendimento do próprio dono da galeria, Perrotin, sem dúvidas muito razoável.

Lamentavelmente – ou não – durante uma excursão no Leeum Museum of Art em Seul na Coréia do Sul, Noh Huyn-soo, um jovem estudante da Universidade de Seul, decidiu dar uma perspectiva menos contemplativa à obra, memorando a banana como uma fonte saudável nutrientes.

Neste contexto, tão extraordinário quanto o próprio fato é o jornalismo que cobriu o evento, buscando ensejo nos movimentos de protesto que vem depredando obras clássicas em museus ao redor do mundo, mas que teve de reduzir-se a concluir, após entrevistar o jovem “reacionário”, que o animus de seu gesto partiu da simples razão de que este estaria com fome – bom para você, garoto -.

Contudo, muito antes de Huyn-soo, partir do readymade de Duchamp, e do americano Andy Warhol, foi estabelecido o relativismo artístico onde habilidade, originalidade e conhecimento estético ficaram a ver navios. Essa histeria coletiva é propriamente a marca que Sir Roger ilustrou como o momento no qual “o artista finge se levar a sério, os críticos fingem julgar o produto dele e o establishment modernista finge promovê-lo. E no final de todo esse fingimento, alguém que não sabe distinguir a arte verdadeira da falsa decide que deve comprá-la”. A partir disso, não parece forçoso ponderar se Perrotin pode estar certo em algum modo.

Afinal, vigor um sistema de trocas e preços que avalia uma banana com fita adesiva em mais de meio milhão de reais enquanto a chama de ‘arte’, e execra que há muito falhamos em conservar alguma decência para os nossos juízos de valor. Pois, no fim do dia, nós somos os leiloeiros que instigam a compra e, ao mesmo tempo, somos nós que precificamos a banana arrematada pelo faminto Huyn-soo.

A ironia é que, para uma obra que supostamente subsiste na crítica ao comércio, após o seu inesperado desfecho, lhe é incutido um toque genial como na conclusão de um ato shakespeariano. Ao invés de apodrecer nas paredes do museu, a banana recebeu um grand finale digno da beleza que representa em tela, materializando a própria crítica que visava insurgir. Assim, se o efeito almejado era o de perplexidade, agora precisamos tirar o chapéu para o jovem gênio descoberto em Seul que, seguindo a lógica, certamente aumentou o valor da peripécia de Maurizio – espero que o jovem estudante receba os seus merecidos royalties -.